domingo, 8 de setembro de 2013

A era da escravidão digital

A era da escravidão digital

Ficar sem internet é uma tortura e checar as mensagens e os e-mails virou um vício difícil de superar

Mikaella Camposmalmeida@redegazeta.com.br

Marcelo Botelho é apaixonado por tecnologia. E esse amor refletiu na sua escolha profissional. Dono de duas empresas na área, o empreendedor precisa ficar o tempo todo conectado. Mas já sofreu muito mais com essa chamada escravidão digital vivida pelos profissionais de hoje. 

Quando ia para casa, depois de mais uma jornada de trabalho, ele monitorava o atendimento aos clientes pelo notebook. Na hora de dormir, o celular continuava ao seu lado. Ele chegava a ficar mais de 18 horas ligado. "Essa angústia não tinha fim. Não conseguia cuidar mais de mim", conta. 

Assim como aconteceu com Botelho, muitos profissionais vivem 24 horas "plugados" às atividades. Alguns chegam a ter mais de três aparelhos de celular para garantir acesso à rede o tempo todo. Além dos smartphones, esses trabalhadores estão sempre com um tablet ou um notebook. Ficar sem internet é quase uma tortura e checar as mensagens e os e-mails virou um vício difícil de superar.

Mesmo depois de um dia tenso de trabalho, essas pessoas acreditam que existe a necessidade de dar mais uma analisada nos relatórios das empresas. Alguns documentos ou programas são armazenados na "nuvem" (espaços na internet) para serem acionados de qualquer lugar.

A gama de recursos oferecidos pelo mercado é tentadora para quem tem um perfil workaholic, ou seja, é viciado em trabalho. Esses brinquedinhos acendem a vontade de mostrar produtividade e de continuar, em casa ou na rua, o que se iniciou no empresa.

CrackBerries
No mercado, esses profissionais já são apelidados CrackBerries, uma referência aos usuários de BlackBerry que se comportam com a mesma compulsão que os viciados em crack para olhar as mensagens que recebem do patrão ou dos clientes.

Marcelo, por exemplo, encontrou uma solução para sua vida de conectado. Os sistemas desenvolvidos pela sua corporação, principalmente para empresas da área de saúde, são monitorados 24 horas por dia por uma espécie de robô. "Ainda ando com dois celulares e fico sempre com um notebook na bolsa. Mas não preciso mais verificar a todo instante se os sistemas estão em pleno funcionamento. Só quando ocorre um problema, grave meus smartphones são acionados. Mas hoje consigo me desligar do trabalho e ter momentos de lazer".

Outro profissional que trabalha com área digital, Celso Fortes, alerta sobre o estresse gerado devido ao comportamento 100% on-line. "Costumo dizer que hoje é o computador que espera o homem ligar. É impossível acompanhar a máquina. É capaz de o trabalhador pifar antes do notebook", brinca.

Segundo ele, vários profissionais ainda não sabem lidar com a informação. "Eles ficam ansiosos e querem uma resposta imediata. Antes as pessoas tinham paciência para esperar um retorno de um negócio. Às vezes, demorava dias. Agora, o trabalhador não consegue esperar e, por isso, vive sempre em hora extra, mesmo estando em casa", disse.

É preciso criar rotina para acessar iPhone

Para todo executivo, um smartphone é algo imprescindível. O aparelho funciona como uma espécie de agenda. É possível verificar informações importantes, acessar os e-mails e até conversar com colegas por meio das redes sociais. E o gerente de projetos da Inflor, empresa de Tecnologia da Informação, Jonas Lugon, aprendeu a controlar o uso do seu iPhone. "O segredo é não olhar. Também estabeleci uma rotina. Saio todo o dia, por volta das 17 horas da empresa, faço atividades física e depois tento relaxar. Só dois dias da semana que me permito utilizar o aparelho fora do ambiente profissional, quando me comunico com funcionários da empresa que atuam no Chile e na China", disse. Todo esse controle tem um motivo. Jonas já foi escravo do trabalho. "Eu não conseguia nem sentar na mesa de um bar para conversar com amigos, pois eu monitorava o trabalho da empresa pelo celular. Agora, só trabalho fora do horário se alguma emergência acontecer", explica.

Você no controle
Grudado no Smartphone
Ele não desgruda do celular nem para almoçar e sair com os amigos. É o tempo todo esperando uma mensagem do trabalho. Geralmente, fica tenso, checando o email a toda hora, com medo de receber uma mensagem importante.

Dormindo com o inimigo

O Iphone e o Blackberry permitem que o trabalhador receba notícias em tempo real do seu escritório. No entanto algumas pessoas chegam a dormir com o aparelho de baixo do travesseiro e acordam, várias vezes, à noite, para verificar emails e mensagens.

Companheiro de todas as horas
Para não ficar desconectado, sem internet, sem cobertura, há profissional que carrega de dois a três aparelhos celulares, mais um tablet e um notebook por onde vai.

Cheio de "tarefa" em casa

Ao chegar em casa o viciado em trabalho não consegue descansar. Em vez de jantar e ficar com a família, ele pega o notebook e tenta dar continuidade ao trabalho. Alguns conseguem ter acesso à rede da empresa de casa e por isso trabalham até altas horas. No outro dia, o cansaço é evidente a sensação de baixa produtividade aumenta.

Medo de não ser bom

A princípio, o viciado em tecnologia é produtivo. Com o tempo, essa característica se transforma em ansiedade. E o trabalhador é incapaz de viver longe de um aparelho celular ou notebook. Ele quer checar mensagens o tempo todo para mostrar que é produtivo e que está atento às necessidades da empresa.

Sempre diz sim

Em seus momentos de lazer ou descanso, esse trabalhador sempre diz "sim" para o chefe. Às vezes, ele fica de stand by, à espera de das ordens superiores. O problema é que esse profissional vive a tensão minuto a minuto.

Tenha bom-senso

Se a empresa lhe der um smartphone, saiba que o aparelho é apenas uma ferramenta de produtividade, não um benefício. Ele vai ajudar você a trabalhar melhor, mas na hora do descanso é importante desligá-lo. Verifique com a empresa os horários que o aparelho deve ficar em funcionamento. Deixe claro que você não quer ficar conectado fora do seu horário de trabalho.

Casa é casa, trabalho é trabalho
Trabalhar em casa não é dever de casa. Ao sair do serviço, é importante se desconectar por completo. Ninguém é feliz ficando 24 horas em hora extra. Evite levar trabalho para casa e se for usar o computador, fuja dos e-mails corporativos.

Você é o chefe
Todo trabalhador precisa saber dominar sua vida profissional. E controlar a tecnologia é importante. Não deixe os aparelhos digitais, como o computador, o notebook, o smartphone mandarem em você. Lembre-se, você deve ser o chefe. Se esses aparelhinhos começarem a controlar sua vida, o resultado no final pode ser estresse. É mais fácil você pifar do que o computador. Então, use tudo com moderação.

Localize-se no ambiente digital
Em vez de se concentrar, o trabalhador pode cair num grande labirinto que é a internet e isso pode atrapalhar o desempenho no trabalho e provocar a necessidade de horas extras de trabalho.

Não se gabe
Não ache legal ficar 18 horas por dia plugado no computador ou no celular, por causa do trabalho. Hora extra tem limite.

Tenha momentos de lazer
Se você fica muito tempo no computador, tente ter momentos de lazer longe desse brinquedinho. Assim, você evita ficar viciado em olhar mensagens, procurar notícias e informações profissionais.

Seja um worklover
Em vez de workholic, seja um worklover. Tenha uma paixão saudável pelo trabalho. Não é pecado ter uma dedicação especial pela vida profissional, desde que a pessoal esteja equilibrada.

Especialistas condenam uso em excesso
Estar conectado na maior parte do tempo para algumas pessoas é reflexo de produtividade. Para as empresas de recursos humanos, isso pode significar insegurança e falta de planejamento. A dica para não ser escravizado é conseguir dominar a vontade de acessar aos recursos tecnológicos.

O headhunter Ricardo Nogueira, da empresa de seleção Junto Brasil, explica que é irreversível o avanço da tecnologia sobre as relações de trabalho, mas é preciso bom senso ao usá-la.

Segundo ele, ao receber um smartphone da empresa, por exemplo, o profissional precisa entender que o aparelho é uma ferramenta de produtividade e não benefício.

É importante, então, não usar o aparelho como uma ferramenta de diversão nem ficar refém das suas funções.

Alguns aparelhos, como iPhone e o BlackBerry, por estarem ligados à internet, recebem e-mails e avisam o usuário sobre as mensagens. Então, ao chegar em casa, a saída é desligar o equipamento.

"A convergência da tecnologia com o ambiente de trabalho é forte. Mas o trabalhador, ao chegar em casa, precisa se desconectar. Se não fizer isso, a pessoa começa a ter paranóia por acreditar que todas as mensagens são importantes e não é capaz de passar momentos com a família", disse.

Para se livrar da escravidão do smartphone ou notebook, o trabalhador deve ser mais organizado, ter hora para entrar e sair do trabalho. E nas horas de folga, privilegiar atividades de lazer que fogem um pouco da rotina do computador, como ir ao cinema, praças e shopping.

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